Chinelos
Eu me rio quando, nas manhãs de
inverno, saio de chinelos.
Portugueses, Brasileiros e Angolanos
olham confusos.
Se bem que aqui até no verão é incomum.
Mas eu saboreio nesse conforto desconfortável
a sensação de estar em casa.
Como se a banca, a praça do marquês e
o Café Pereira fossem extensão da minha sala
Me reservo até o direito,
gramaticalmente correto
(o que não me interessa nada),
de grafar assim o nome da praça:
"marquês", minúsculo.
Seja por anarquia a questionar títulos
ou por me sentir ironicamente íntimo.
Também me agrada, particularmente,
o estranhamento. O olhar para o estrangeiro me fascina.
Talvez vejam algo estranho num dia tão…
monótono, opaco.
Valem risadas, olhares pouco usuais,
alguma mudança, questão, movimento;
seja dos chinelos ou não
Mas, por enquanto,
só sou capaz de estranhar passivamente
Não sou nato provocador ativo: Antônio Abujamra.
Esse parece que nasceu pra isso,
um personagem vivo.
Talvez nada seja inato,
talvez Abu tenha fracassado até ser
mas ele parece tão confortavelmente desconfortável
que me faz desejar ter nascido assim.
Um dia quem sabe,
depois de tantas mortes e chinelos
eu possa finalmente ser um agente
dessa coisa tão bonita que é estranhar

